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terça-feira, 11 de março de 2008

A Desconhecida (A ausente)

Para conhecer-te, que devo eu fazer Cordélia?
Devo eu imergir nas propriedades mais secretas do éter?
Ou devo desperdiçar minha vida inteira
Estudando herméticamente a estrutura elementar da matéria,
Para assim ter um breve vislumbre
Da rica complexidade de sua natureza?
Que faço eu Cordélia
Para conhecer-te em tua ausência?
Buscarei eu na minha solidão e melancolia
Transformar meus metais
No ouro mais perfeito, no ouro astral
E oferta-lo-ei no dia festivo de suas núpcias?
Trarei elementos fortes:
Sal, Enxofre e Mercúrio
Para cingir seus rins durante a purificação
De seu corpo em chamas?
Que faço eu para conhecer-te Cordélia
Dentro dessas negras sombras dançantes
De tua grande ausência?
Apenas pergunto,
Torvo, delirante e febril ao eco
Que me trai a resposta.

terça-feira, 4 de março de 2008

Se essa rua fosse minha....

Se essa rua fosse minha,
Eu explodiria as estátuas da praça
Até as mais belas e sacras,
Colocaria fogo nas casas
E plantaria um jardim
Sem reticências. . .

Se essa rua fosse minha,
Suspenderia o trafego de carros
Para somente as pessoas passarem
Descalças,
Elas mesmas.
Sem suas palavras
E seus documentos. . .

Se essa rua fosse minha.
Não haveria rua.

A náusea

Deixo os livros pra depois
E descrevo agora
Minha náusea
E sua supertições.
É uma náusea não-liquida
Supliciada,
Daquilo que esta por vir
Da partida aos avessos,
Com gosto de fim.
Náusea primitiva
Da espera desengonçada
Transformada no instante da véspera.
Náusea lutuosa
Do esquecimento permanente
Na ótica de todas as coisas.
Náusea na véspera.
Náusea no entardecer.
Náusea ao adormecer.

Nos trópicos

Via a lua crescer no tão próximo horizonte do tempo,
Crescer com todo o vigor de tua sempre juventude.
Vi ela, então, cruzar todo o firmamento
Espraiando sua nívea luz de remissão e remorsos,
Para morrer nirvanizada noutro extremo do mundo.
Acompanhei as mudanças de estações nos trópicos.
Vi as flores e folhas caírem sem nada explicar,
Pessoas usando camisas-de-flanela,
E o vento aos poucos, varrendo ruas desertas.
Então vi e senti um frio de dez invernos,
A estação austera fez-se hóspede em meus dias.
Os vegetais e plantas sendo queimados pelo gelo,
O gado e os animais buscando refugio nas arvores mais robustas
As mesmas ruas desertas, agora mais gélidas e mais solitárias
Os seixos singrando dores, no orvalho da madrugada fria de ausências.
Suportei o silencio e a conformação
No vazio de uma casa vazia,
Sem televisão, ou qualquer outro meio de comunicação entre os vivos.
Suportei às duras custas, o tédio, a grande solidão com mágoa
E a própria loucura,
Numa das estações mais homicidas.
Com a mais vigilante serenidade,
Esperei os pássaros migrarem ao seu lugar de origem,
Esperei a natureza se cobrir com seu manto-veludo de cores e aromas,
Vi a vida se renovar dentro e fora de mim.
Os velhos sorrirem e as crianças correrem.
Vi a terra ser preparada para o plantio,
Borboletas, libélulas, pirilampos e o pólen sendo fecundado em pleno ar.
Vi o astro-rei com brilho de ouro
Dourar cabelos, trigais e festas,
Aquecer andarilhos e secar as roupas que quaravam no quintal.
Vi as fontes e riachos transbordarem as águas que guardavam,
Tal como uma mãe acumula leite em seu seio para o fruto de seu ventre.
Vi a semente germinar, as crianças crescerem
E uma jovem dançar descalça ao crepúsculo,
Com um sonho em seu coração.
Vi as mudanças de estações nos trópicos,
Vi muitas outras coisas também,
Apenas você que eu não vi mais.